terça-feira, 8 de maio de 2007

A paralisação do Meio&Mensagem

Numa época em que os salários são baixos e os estagiários são mão-de-obra qualificada barata; numa época em que há filas de pessoas querendo roubar nossos empregos; numa época em que registro em carteira é algo do qual você apenas ouviu falar, o inesperado aconteceu: uma greve.

E não foi uma greve qualquer: a redação do Meio&Mensagem realizou hoje uma paralisação de protesto contra a demissão de seu editor-adjunto, Costábile Nicolleta. Ao todo, 13 jornalistas aderiram ao movimento, com exceção de uma jovem pelega que alegou estar em "período de experiência".

O Meio&Mensagem é um jornal semanal que cobre principalmente os setores de comunicação e publicidade. Segundo os funcionários do periódico, Costábille foi chutado porque aprovou a publicação de um obituário sobre a morte de Octávio Frias, fundador da Folha de S. Paulo.

Até aí, nada demais. O problema é que o texto continha um pedaço de verdade: dizia que o empresário fora apoiador do regime militar e entusiasta do golpe de 64.

Isso não é mentira e sempre foi fato público e notório. Mas, ao que parece, a Folha de S. Paulo resolveu renegar seu passado ideológico, já que hoje em dia o apoio a regimes golpistas não é lá muito bem visto pela esmagadora maioria de seus leitores.

Afinal, no Brasil, só o governo popular-socialista do camarada Lula é ditatorial, anti-democrático, feio e mau. A imprensa é do bem, plural e não tem rabo preso com seus patrocinadores.

O segundo e maior problema é que a Folha é uma das maiores anunciantes do Meio&Mensagem. E nessa atividade democrática e combativa que é o jornalismo, não é bacana criticar quem anúncia nos jornais.

Imoralidades à parte, a greve chama a atenção não pelos seus motivos, mas sim por seus efeitos: ela mostra que é possível, sim, mobilizar uma classe de profissionais pela busca de soluções para os problemas cotidianos de sua profissão.

A propósito, para combater casos de coação moral como esse nas redações, os sindicatos da categoria tem como principal proposta a criação de comitês de redação.

Os comitês existem há bastante tempo em diversos países da Europa, e funcionam como instâncias onde os jornalistas da redação de um determinado jornal têm poder sobre a política editorial dos veículos para os quais trabalham, assegurando sua independência em relação a anunciantes e outras formas de poder econômico.

Esse poder é exercido em assembléias, como nos diários franceses, ou por meio de estatutos e regulamentos, como no caso do espanhol El País. Não se trata de se rebelar contra linhas editoriais pré-estabelecidas, mas apenas de respeitar o que de fato foi previamente acordado entre os donos do jornal e os jornalistas por ele empregados.

É claro que sempre haverá ingerência nos jornais. No entanto, esse tipo de medida reduz consideravelmente a margem para tosquisses como a que foi cometida contra Costábile.

Assim, fica garantida a pluralidade de opiniões na imprensa e a coerência dos meios de comunicação com suas próprias linhas editoriais sem que haja necessidade de prostituir seus jornalistas aos anseios de anunciantes e patrocinadores.

Em meio a essa relação incestuosa, fica difícil não citar Mino Carta:
"O Brasil é o único país do mundo onde os jornalistas chamam seus patrões de jornalistas".
Pensando bem, deve ser por isso que aqui lutamos sem medo pela liberdade de empresa. Quer dizer, de imprensa.

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